O bordado do meu vestido de noiva

Caminhava apressada. Trazia três carcaças num saco de plástico e um ramo de flores do campo na mão que sobrava. Vinha longe mas já a rir-se, a preparar-se. Apostei que vinha conversar, mesmo que aquela chuva insistisse – ganhei esta história.

Olá, boa tarde! Já vão embora? É uma pena não ter aqui a chave da minha oficina, gostava de vos mostrar os meus bordados.

Idalina é de Santiago do Cacém. Já passou dos 80 anos. Chegou ao Lousal depois de casar. O marido veio trabalhar para a mina, ela veio com ele.  

Eu também lá trabalhei, mas era coisa leve. Era escolher o minério, com as outras mulheres. A minha paixão foram sempre as artes manuais e a escola.

Não chorou com os homens – nem como eles – quando a mina fechou. Dedicou-se aos bordados, a fazê-los e a ensinar os mais novos. E nunca envelheceu.

Tenho três filhos criados, tudo doutores.

Mas não tem idade para ter tido nenhum.

Até o senhor da escola onde dou aulas me diz: “A dona Idalina não morre!”

Ela tem, em cima de um corpo velho, uma cabeça jovem. E tem, por baixo das rugas, uma cara de menina. Idalina não tem nem mais um ano do que eu, mas disfarça: traz uns colãs grossos, castanhos, e uma saia de napa, de avó, como a camisola de lã cinzenta, com flores desenhadas.

Conta, apaixonada e enérgica, o gosto pelo ensino, de que não tira folga, e pelos bordados.

Cópias de obras com centenas de anos. Devia ver, menina, devia ver. Agora o mundo é muito pequeno, é tudo ali ao fundo. Veja lá que eu estou a fazer trabalhos para a França e para a Guatemala. E chega lá tudo muito depressa! A gente põe-se em todo o lado num instantinho.

A conversa acabou com a promessa de um regresso. É que a Idalina vai fazer um lindo bordado no meu vestido de noiva.

Até já o tenho na cabeça.

Vai bordar o meu vestido – assim que deixarmos de ser meninas.

Joana.

Joana