Covid-19: ultrapassar, enquanto fotógrafo, a epidemia e a crise económica

A epidemia de coronavírus vai mudar-nos a todos: enquanto indivíduos e sociedade, e enquanto agentes económicos.  A recessão vai ser acentuada e os impactos já se fazem sentir. No meu caso, que me reparto entre a fotografia de casamento e a fotografia corporativa, todas as “encomendas” foram canceladas ou adiadas, e não terei novo negócio durante meses. Este texto é uma partilha para os meus camaradas de profissão, e é apenas o relato da minha experiência.

Apesar de todas as incertezas, não será surpresa que o inédito estado de emergência que vivemos seja prolongado mais uma ou duas vezes, como será esta semana, e que as medidas restritivas sejam reforçadas. Perante as incógnitas, é imperioso agir em vez de reagir.

Comuniquem desde já com todos os vossos noivos. Todos, e não apenas os de Junho ou Julho. Ajudem os clientes a perceber quais são as opções que têm: adiar, em vez de cancelar; conciliar, em vez de litigar. Tranquilizem-nos mostrando que estão a pensar neles, na melhor forma de os ajudar a concretizar os seus planos e de prestarem o vosso serviço.

O mesmo se aplica às equipas de vídeo e aos wedding planners com quem trabalham, sejam ou não parceiros directos. Esta fase está a ser particularmente angustiante para aqueles que estão a gerir os casais estrangeiros que planeiam vir ao nosso solarengo país durante os próximos meses. Enquanto fotógrafos devemos querer ajudar.

Comecem já a trabalhar a agenda de 2021. Não é a minha experiência, mas alguns companheiros estão preocupados com a eventualidade de muitos dos adiamentos de 2020 quererem ocupar as datas mais concorridas do próximo ano, limitando o novo negócio. É uma discussão relevante.

Se forem confrontados pelos vossos clientes com novas datas para as quais já não estão disponíveis, e independentemente do que seja a vossa prática contratual com reservas, depósitos e sinais, cancelamentos ou adiamentos, ajudem a encontrar uma solução. Da mesma forma, se adoecerem com a Covid-19 e não puderem fotografar um casamento, somos tantos profissionais no mercado que decerto encontraremos alguém disponível para executar o trabalho ao mesmo nível, desde que estejamos organizados.

Preparem-se para navegar pela tempestade assumindo que será duradoura. O que vão fazer se 20% dos casamentos forem adiados ou cancelados? E se forem 50%, ou mais do que isso? Como ultrapassar a quebra de receitas previstas para 2020? Se ainda não está feito, este é o momento de sistematizar e trabalhar as contas do negócio.

Para os trabalhadores independentes haverá medidas compensatórias da paragem total da actividade, já decretadas pelo Governo, com limite máximo da subvenção nos 438 euros por mês. Desconheço o que possa existir para as empresas, mas tudo o que for sendo decidido no âmbito da epidemia de Covid-19 está agregado aqui.

Racionalizem os gastos e alterem os planos de investimento. Renegoceiem a renda do escritório ou do espaço de trabalho que alugam. Revejam todos os vossos pequenos encargos com esta economia das subscrições — eu achava que gastava quase nada, mas é verdade que me surpreendi. E embora gostasse de trocar o meu portátil de 2013 por um mais actual e reformar o meu monitor de 27”, o facto é que o computador ainda é excelente — sobretudo porque parei de actualizar o MacOs e o Lightroom há, talvez, uns dois anos.

Eventualmente, de acordo com a vossa realidade familiar, reorganizem a economia doméstica. Por aqui, adiámos (mais uma vez) a decoração da sala, que há dois anos continua com a mobília de quando éramos só dois e vivíamos noutra cidade e num andar pequenino e sem varanda. Também não viajaremos para férias. E temos um plano de contingência para activar se a recessão for brutal, mas no imediato não equacionamos outras medidas — planeámos bem, em 2017, os encargos fixos quando decidimos mudar-nos e aumentar a família, e acredito que vamos colher agora os frutos dessas opções.

Por fim, se aguardam pagamentos de clientes empresariais por facturas emitidas há um ou dois meses — continuo sem compreender esta convenção portuguesa de que as facturas dos pequenos fornecedores esperam mais de 60 dias até serem liquidadas — comuniquem com eles e apelem à solidariedade possível no actual contexto. Cada realidade é distinta, e acredito que as dificuldades de tesouraria já aí estão e que vão agravar-se,  mas decerto que haverá clientes com liquidez que permita acelerar pagamentos. E, afinal, se temos de estar em casa, mais vale telefonar ou escrever, e ir comunicando com os nossos parceiros.

No essencial, estamos nisto juntos. No impacto da recessão e da crise que vão seguir-se, e na preocupação com a saúde dos nossos. Enquanto agentes de um sector económico, o dos casamentos, acredito que ultrapassaremos melhor esta epidemia se o fizermos em comunidade e em partilha.

30.Mar.2020